31 maio 2007

depois da tempestade...

... a bonança.

E não é que eu não a aguento?

fumo branco

Ainda não é oficial, mas já consigo ver os fósforos a sair da caixa, o balanço para o movimento de os riscar está lá, daqui até que se acenda é uma distância ínfima.
Invejoso, mas definitivamente satisfeito. E ainda um pouco orgulhoso.
Parabéns!

29 maio 2007

you say potato...

Dizem sobre ingleses e americanos que são dois povos separados por uma língua comum. Esta afirmação, vista através de uma lupa que nem necessita ser assim tão potente, tem muito que se lhe diga – novamente em estrangeiro, there’s more to it than meets the eye.

Recentemente, tomei conhecimento de um caso em que duas pessoas, falando uma mesma língua, não se entendem. De facto, percebem as palavras um do outro, conseguem perceber as frases, mas não fazem ideia sobre o conteúdo mais profundo, as razões por detrás das palavras do outro: aquilo que ouvem simplesmente não faz sentido, é até incoerente, ouvido daquele modo.

Para tentar entender melhor o discurso, pediram ajuda a um tradutor-intérprete, amador, que tratou de traduzir o que cada um dizia, utilizando a linguagem que, na perspectiva dele, do técnico, fosse mais perceptível para o outro. O intérprete desempenhou o seu papel do melhor modo que sabia, agindo ora como tradutor, traduzindo de modo literal algumas das expressões utilizadas, ora como intérprete, indo ao ponto de tirar ilações do discurso, confirmando essas conclusões junto do emissor, de modo a garantir a exactidão do resultado do trabalho.
Finda a tarefa, o tal amador retirou-se. Partiu, no entanto, com a convicção de que o trabalho efectuado (caracteristicamente pro bono, embora seja absolutamente irrelevante para o caso), pouca ou nenhuma utilidade tinha tido.
Ter-se-ia tratado de uma conversa de surdos? Talvez.

Subsistiu nele, por isso, uma ligeira sensação de frustração, que o fez meditar de modo mais prolongado sobre os discursos ouvidos, as eventuais razões por detrás deles, julgou tons de voz, expressões faciais, tudo o que tinha ao alcance para tentar encontrar a interpretação certa para toda a informação a que tinha tido acesso.
Muito mais do que uma conversa de surdos, parecia agora claro que tinha sido uma conversa de mudos, em que ambos sabiam que aquela conversa tinha que acontecer, mas nenhum dos dois tinha certezas sobre o que tinha para dizer.
Ou, a tê-las, teve medo de dizer alto (talvez até para si mesmo) o que, na verdade, pensava e sentia.

… I say potato…

27 maio 2007

intenso

...

Há outra forma?

gps

Mais importante que o destino, é o caminho que se percorre para lá chegar, o prazer da viagem.




Devo ter ouvido isto em qualquer lado: não sei a quem dar o crédito, mas não o reclamo.

maré alta no atlântico


Com uma pronúncia quase imperceptível, integrando tonalidades musicais totalmente improváveis e num Atlântico a transbordar de gente, tivemos som de altíssima qualidade.
A repetir.

25 maio 2007

território solitário


- E agora? Estamos aqui há séculos, andamos para trás e para a frente, não saímos do mesmo sítio.
- É verdade. Isto estagnou.
- Estagnou?
- Desculpa, expressão desajustada: bloqueámos parece mais correcto. Não conseguimos sair daqui: desta vez, por mais que eu queira, por mais que fales comigo e me vás dando as pistas que costumo usar para te orientar, não posso, não consigo encontrar o caminho. Acho que me perdi…
-Tu nunca te perdes: tu és tão sereno, como podes ter-te perdido?
- Não te consigo mentir, pois não?
- :-) não, não consegues.
- Eu talvez saiba o caminho – ou antes, eu sei dois caminhos. E nem preciso de tos apontar, sabes tão bem quanto eu que caminhos são esses.
- Sei…
- Pois sabes. Até sabes qual deles mais te atrai.
- Sei…
- Sabes por que é que é esse que mais te atrai?
- …
- Sabes?
- Vais dizer-me?
- Porque só vês a primeira parte do caminho, não sabes o que está para além. No outro, o que menos te atrai, conheces esta primeira parte e conheces o que está para além – conheces a estrada quase toda, as curvas, as subidas e descidas, até conheces de cor os buracos, já sabes desviar-te deles com mestria.
- Tens razão.
- Não me serve de nada, pois não? Nem a ti…
- O quê?
- Ter razão: estou para aqui a falar, já não adianta nada falar, ficas na mesma.
- Não, fala, gosto de te ouvir.
- Mas eu vou calar-me. Acho que este é o momento em que tens que andar por ti, sem ajuda. Caso eu me ponha para aqui a falar mais, acabo por ser eu a decidir por ti e isso não faz sentido algum, não tens que percorrer o caminho que eu julgo ser o melhor para ti, mas o que tu escolheres para ti. Porque é teu, não é meu.

- E sim, agora calo-me.

special treat

Em estágio para esta noite.





depois de ouvir melhor, este bem que podia ser:

Story - part 8.1

And as you go I will spread my wings

24 maio 2007

estatísticas

(número qualquer coisa, perdi a conta)

Cedo esta manhã tive que ficar à porta de casa, cabeça exposta à chuva, olhos postos na rua na esperança de ver chegar um veículo com a dimensão adequada ao transporte de electrodomésticos e com um qualquer logo que eu reconhecesse da loja onde coloquei a encomenda.
Tardando a chegada de tal transporte e como moro a escassos metros do liceu da minha terra, nos momentos em que desviei o olhar do alcatrão fui observando a horda de jovens que se dirigiam para as aulas. Hábito antigo, fui fazendo uma estatística mental não contabilística tipo thumbs up, agrupando as pessoas.
Concluí que:
1. na minha zona de residência, verifica-se uma quase total ausência de africanos;
2. nunca reparei na existência de uma população indiana significativa, mas que têm muitos filhos, isso têm;
3. ao contrário dos chineses, que só na minha rua têm 3 lojas mas adolescentes não há (ou então há e não os mandam à escola, continuando a preferir o ábaco);
4. as adolescentes desta geração têm muito mais buracos que as da minha;
5. os adolescentes também, embora menos;
6. se é verdade que a minha geração era (e continua a ser) constituída por elementos do mais feio que a Europa produz, então com esta geração é que o futuro estético do País está seriamente ameaçado;
7. as empresas de transporte não cumprem horários;
8. estar muito tempo à chuva molha muito;
9. e, finalmente, que se podem deixar as portas do prédio e do apartamento abertas e ir trabalhar, em vez de ficar à espera indefinidamente por fornecedores: eles que cheguem, descarreguem, o último a sair que feche a porta.

23 maio 2007

story - part 8

Not so long ago, it was the better way.



tell me




...'cause i really wanna know





Esta tem sido ouvida com frequência por quem gosta (como eu) de estar perto dos crime scene investigators.
É verdade (e desta vez a verdade existe for language's sake): aquele senhor que aparece a cantar de óculos, o Roger Daltrey, tem um filho da minha idade.

descomplicando

Concedo: a realidade existe, em diferentes perspectivas, de diferentes pontos de vista. É tangível, palpável.
A verdade?
Na verdade, a verdade não existe, não se pode agarrar nem ver. Para o demonstrar? Os comentários anteriores bastam: se a verdade existisse não haveria tanto desacordo nem tantas versões relativamente a uma coisa que todos querem afirmar absoluta.

complicar

Parece que querem, não querem?
É só eu ter tempo.

22 maio 2007

a realidade

a que não existe; ou que, a existir, não é igual para todos

exemplos geométricos
(que é o mesmo que dizer que faço um desenho para explicar)




Imaginemos:
O observador no ponto A quer ir para C: tem que virar à esquerda, C encontra-se à esquerda de A; o mesmo destino, para o observador em B, encontra-se à direita deste – ainda que o destino seja o mesmo. Logo, conclui-se que são realidades distintas, dependendo do observador, podemos até chamá-los de “pontos de vista”.

O observador em A sabe que tem B à sua frente; caso alguém se desloque de A para B, o observador que permaneça em A vê a pessoa P (pê de “pode ser esta letra”) pelas costas, afastando-se, enquanto que o observador em B vê a mesma pessoa P afastando-se de A, mas vê P de frente. Logo, uma realidade distinta, ainda que a realidade seja a mesma. Certo? Não: discutível, claro.

Se agora afirmarmos que o ponto D não serviu para nada, então estamos de acordo sobre esta realidade; no entanto, sabemos que existirá sempre um observador externo ao ecrã que afirmará que D serviu como ponto de equilíbrio, como eixo de simetria para dar significado ao desenho. E aí, a realidade e a verdade desaparecem, cada um cria a verdade e a realidade que entender.
Mesmo que o ponto D tenha sido colocado apenas para baralhar isto tudo.

A verdade não existe, ok?

a verdade?

“Por vezes, o sonho por concretizar é mais perfeito que a realidade”, escrevia um anónimo.
Eu replico. O sonho é sempre mais perfeito que a realidade. Porque nunca sabemos qual é a realidade, realidade e verdade são conceitos relativos, inexactos.

Quantos anos vivemos perto, ao lado de uma pessoa, para, anos mais tarde, julgamos ter sido enganados por ela, afinal aquela pessoa era outra?
Dito de outro modo:
Quantos anos conseguimos viver perto, ao lado de uma pessoa, por termos construído dela uma imagem na nossa cabeça, por termos construído uma realidade nossa, mas que não era “a” realidade, “a” verdade?
Ainda de outra maneira:
Durante quantos anos conseguimos manter viva a ilusão de que a pessoa que estava ao nosso lado era aquela com quem, um dia, sonhámos compartilhar esses anos? Durante quantos anos conseguimos manter vivo esse sonho?

A realidade (aquela que é verdadeira, para nós, num momento qualquer) pode não passar de um sonho que continuamos a sonhar acordados, do qual conseguimos não acordar: vemos a realidade como a queremos ver, como queremos que ela seja. Até um dia, em que a realidade se torna na tal verdade que nunca vimos – e que pode estar ainda longe da verdade.
O sonho é mais perfeito que a realidade, no sonho as coisas são sempre como queremos e a tal verdade não surge, de repente, inoportuna, não nos rouba a felicidade em que julgamos viver.

A verdade? A verdade não existe.

traços IV

Os que não fiz!

18 maio 2007

espreitar

Uma espreitadela a um local pertencente a um homónimo e encontrei isto:


Uma noite destas sonhei contigo. Não sei porquê.(como se alguma vez soubéssemos por que é que sonhamos com o que sonhamos)Reformulo, então.Uma noite destas sonhei contigo. E sei porquê. Porque nunca te toquei sem ser na face ou nas mãos para os cumprimentos socialmente aceites. Porque nunca dormitaste no meu colo. Porque nunca te lavei o cabelo. Nunca soube o calor do teu abraço. Ou a que cheirava o teu pescoço. Nunca vi como serão as tuas olheiras ao acordar. Nunca senti o peso das tuas pernas nas minhas debaixo dos lençóis numa interminável manhã chuvosa de domingo. Nunca medi o ângulo da tua anca. Ficaste-me por conhecer. É por isso.


Gostam tanto como eu?

17 maio 2007

a caravana passa

Todos os dias somos confrontados com situações que nos desagradam, nos irritam, que, de certo modo e até um certo limite, nos fazem mal, de tanto nos incomodarem. Em rigor e numa boa parte, são situações que não nos dizem directamente respeito, relativamente às quais poderíamos perfeitamente passar ao lado, ou das quais poderíamos simplesmente desviar o olhar. E seguir calmamente em frente.
Mas não: optamos tantas vezes por enfrentá-las, noutras quantas até por desafiá-las, provocá-las. Atiçá-las.
Com que fito? Não sei: sei apenas que nalguns casos é quase visceral, e foi assim que, em tempos, cheguei a actuar; e é assim que verifico que tantos outros agem.
Facto estranho em mim, aprendi com os próprios erros (e consequências e dissabores destes) e consegui alterar a minha postura relativamente a este tipo de ocorrência. Com o novo método, resultado desta auto-aprendizagem, consigo preocupar-me e incomodar-me com o que e com quem efectivamente merece a pena, atribuindo-lhes, nesse caso sim, a importância que têm e dedicando-me a essas “causas” de corpo e alma, sentindo que posso realmente fazer alguma diferença. Nos demais casos? Não julgar.
Como se chama o método? Tolerância. Acho eu. Ou “live and let live”, em estrangeiro.

16 maio 2007

sem resposta

- Pai? - diz uma voz com 5 anos de idade.
- Filha?
- Olha lá: se os palavrões não se podem dizer, então para que é que foram inventados?

dos and don'ts






..old enough to see behind me but young enough to feel my soul...

15 maio 2007

de certeza?

11 maio 2007

como se o orvalho te tivesse beijado

Não sei de que é que estou à espera. Que chegues a casa, eu oiça a porta a abrir e a fechar-se, veja a tua cabeça à entrada da sala.
- Olá
os teus passos corredor fora na direcção da cozinha ou do quarto, um estore que desce, uma torneira aberta, um armário, tu de novo a aproximares-te de mim, a sentares-te na sala com um suspiro.
- Então?
a esqueceres-me, a ligares o televisor, a apanhares uma revista de moda do cestinho ao lado da poltrona, o teu perfil, agora de óculos, a folhear horóscopos, vestidos, maquilhagens, a voltar-se marcando a página com o dedo
- Tens fome?
a boca séria, os olhos sérios, o colar mexicano
mexicano?
da mesma cor que a blusa, tirares o brinco para responderes ao telemóvel num
- Olá
diferente do
- Olá
que me deste, mais vagaroso, mais terno, embrulhado na fita de um sorriso, conheci esse modo de falar há tantos anos, esse corpo inclinado para trás, os dedos a arranjarem o cabelo como se a voz que não oiço te conseguisse ver
- Amanhã, depois de amanhã, quarta-feira aposto que um homem que não sei quem é ou prefiro não saber quem é, as pernas a cruzarem-se em sentido contrário
- Eu depois ligo-te, sim?
o telemóvel guardado na carteira, o sorriso dissolvido na boca séria, nos olhos sérios, no colar mexicano
- Não me disseste se tinhas fome
há quanto tempo deixaste de gostar de mim, há quanto tempo isto, deitas-te primeiro do que eu, acordas por um segundo quando chego à cama
- Importas-te de apagar a luz?
sumida na almofada de costas para mim, dispo-me na claridade dos números do despertador, o colchão vibra acordando-te de novo
- Meu Deus
encontro de manhã os meus cereais numa bandeja e o apartamento vazio, um resto de gotas na cortina do chuveiro, a tua escova de dentes húmida ao lado da minha escova de dentes seca, a tua ausência tão presente na revista de moda esquecida no sofá, a tigela dos teus cereais no lava-loiças com a colher lá dentro, cheia até meio de água esbranquiçada, uma franja de tapete que um dos teus saltos descoseu, o colar mexicano
mexicano?
no tampo da cómoda, que roupa terás hoje, que penteado, que sapatos, com quem vais almoçar, se peço à minha secretária para falar com a tua
a senhora doutora saiu ou se não saiu
- Diz depressa que tenho imenso trabalho de forma que não sei de que é que estou à espera. Já com as chaves do automóvel na mão fico diante da casa de banho a observar as gotas na cortina do chuveiro e a imaginar-te saindo do duche com a toalha maior à cintura e a mais pequena na cabeça, escorrendo lágrimazinhas de fumo como se o orvalho te houvesse beijado. Imagino os teus pés nos azulejos, as tuas costas, os teus ombros, instalo-me ao volante contigo nua ao lado e a pouco e pouco, à medida que a garagem da empresa se aproxima, uma paz, um contentamento, uma exaltação de namorado. Tenho a tua fotografia aqui na estante dos livros, junto à medalha do torneio de ténis e à carta emoldurada do ministro, uma fotografia de há cinco anos se tanto, de óculos escuros, na praia, a acenares para mim. Costumávamos cear na varanda a afastar os mosquitos, dúzias de lanternas de barcos acendiam-se no mar. Talvez fossemos felizes nesse tempo. Fomos de certeza felizes porque as paredes do coração eram tão finas que se podia escutar do outro lado.



Antonio Lobo Antunes

espreitar

Um que é só para me divertir.

você

ou "quem não se sente não é..." parte II

Para além da educação familiar, tive a sorte de ter tido formação numa escola reputada. Nesta, foram-me incutidos um conjunto de valores que ainda hoje, a uma grande distância, considero correctos e que tento fazer valer, muitos dos quais me orgulho por defender.
Para além dos valores, houve um conjunto de hábitos próprios da escola que se mantêm ao longo da vida. Um deles, o agora relevante, está relacionado com a forma de me dirigir às demais pessoas com quem me vou cruzando ao longo da vida.
Tendo a língua lusa uma vastidão de modos à escolha, a verdade é que apenas dois são vulgarmente utilizados no quotidiano. Desses dois, habituei-me a utilizar o simples “tu” para me dirigir àqueles que considero como iguais, ao mesmo nível – nível etário, educacional, cultural, relacional, profissional, afectivo (um pouco de tudo): não se trata de distinção de nível social, não entendo existir essa barreira entre as pessoas – deixando o outro para aqueles a quem devo deferência ou, de forma mais comum, por quem não nutro qualquer tipo de sentimento.
Não sendo, na minha perspectiva, a deferência um sinal de respeito, antes uma necessidade social, aqueles com quem utilizo o “tu” e que considero dignos de tal tratamento são efectivamente aqueles que mais respeito. Aceito diferentes hábitos, considero-os apenas mais ou menos adequados, não os julgo nem os classifico: não tenho esse direito. E ficaria definitivamente a perder, caso o fizesse.

10 maio 2007

a caminho





Ando há dias com isto na cabeça...

contribuições

Recentemente, pedi a uma mão mal cheia de “amigos” cuja escrita admiro que contribuíssem para a criação de conteúdos que eu pudesse usar. No muito breve texto em que a tal apelava, afirmava que na génese do pedido estavam o reconhecimento pela escrita deles e a ausência de inspiração que tantas vezes me atinge – forma soft de reconhecer também que sou mandrião.
Afirmava ainda que o pior que poderia acontecer seria receber na reposta a tal ousado pedido um rotundo “não”. Esta última veio a revelar-se como uma fraca antevisão, uma vez que o pior que efectivamente aconteceu foi ser alvo do total desprezo, nos casos em que nem sequer o mais ou menos justificado “não” veio de volta.

A única resposta afirmativa veio da Thunderlady, cujos conteúdos constam da minha curta e já justificada lista de links – se alguns não aparecem explicados será por serem auto-explicativos, após curta leitura.
Sendo esta uma autora quase compulsiva e pensando eu que a contribuição chegasse com brevidade, a verdade é que tardou umas largas semanas a enviar o contributo – e a espera compensou.
Completamente “out”, já que considero esta contribuição à margem daquilo que dela já li, constitui algo que preenche na íntegra os objectivos do meu apelo: enriquece este meu espaço.
Obrigado.

09 maio 2007

parabéns

Mais um dia de trabalho. Mais um? Não, não mais "um".
Rafael chegou cedo - como em todos os dias. Extremamente pontual na chegada e nunca preocupado com a hora da saída.
A calma dele, aquela calma que fazia com que tivesse sempre um bom desempenho, aquele sorriso tímido que arrancava sempre uma resposta favorável, o modo assertivo de falar... Muitos colegas o invejavam pela proximidade distante que mantinha, sem saberem que não era forçada, era característica do seu feitio. Sem saberem o quanto ele gostaria, secretamente, de ser mais sociável, mais extrovertido, menos calado.

"Mais um dia de trabalho",
pensou Rafael,
"vai ser só mais um dia de trabalho, ninguém se vai lembrar, não terei que fingir. Só espero ter a prenda que quero".

"Parabéns Rafael!"
Gritaram todos os colegas quando ele entrou na sala do café. Seguiram-se os abraços, as pancadinhas nas costas, as piadas
"Hã, mais um ano.. menos juízo, já se sabe"
"Então, a tua gaja? Embrulhou-se só para ti?".

Estava tramado.

"Rafael, então, pá? É só mais um ano, pá, um sorriso é só o que se pede, homem! Parece que vieste para um funeral, caramba!"

Rafael sorriu, forçado. Precisava de um canto para se enfiar, onde pudesse estar sozinho. Casa de banho. Na casa de banho pode sempre estar-se sozinho. Entrou. Escolheu a divisória mais afastada da porta. Sentou-se na sanita, trancou a porta. Pôs os pés para cima. Pegou no portátil e começou a trabalhar. Era escusado. Ia falar ao chefe. Não podia estar assim.

Saiu da casa de banho. Pousou o portátil em cima do balcão, abriu a torneira. O barulho da água acalmava-o. Arregaçou as mangas da camisa, inclinou-se para a bacia, olhando sempre olhos nos olhos no espelho. Olhando-se nos olhos. A si próprio.

"O que andas a fazer, Rafael?"
perguntou-se enquanto mergulhava a cabeça debaixo da água que corria, fria.
"O que andas a fazer?"

Secou-se. Aquela situação andava a arrastar-se há demasiado tempo. Já nem sabia onde estavam.
O que começou com um beijo fugaz na sala das fotocópias havia quase 2 meses tornou-se fogo, queimava, prendia e libertava e ele não sabia como tinham chegado ali. Já não sabia se era por vício. Já não sabia se era por curiosidade. Só sabia que o desejo da carne era insuportável. A necessidade de a ver, falar com ela. A necessidade de a tocar, de a sentir.
Tinha que falar com ela. Porque para ele não passava de carne: ela dava-lhe o melhor sexo que ele alguma vez tinha tido, sem drogas, sem álcool, sem nenhum tipo de subterfúgio. Sexo, bom. Não, bom seria pouco. Sexo muito bom, como nunca tinha pensado que existia. Era apenas isso. O resto não estava programado.
Ele queria uma mulher "normal". Dona de casa. Boa mãe, com valores. Ao mesmo tempo não queria pensar isto, mas para ele era incompatível que ela fosse excelente na cama e boa mãe de família. Ela queria ter duas: a Marta para aquele sexo do outro mundo e uma rapariga que nem precisava ser linda e boazona, bastava que fosse meiga, inteligente e boa dona de casa - como a mãe dele.

Marta abordou-o no corredor, quando ele vinha ainda a secar o pescoço com o toalhete de papel:
"Preciso falar contigo".
Rafael empalideceu. Encostou-se à parede. Não era de rezar, mas rezou. Rezou porque aquilo era apenas sexo. Nem paixão havia. Sexo. Uma queca fabulosa, um cigarro no fim, o banho. O
"Até amanhã, no escritório"
sem um beijo sequer.
"Estou grávida."




Contribuição da Thunderlady, a pedido meu.
Este pedido foi feito a mais eventuais contribuidores. É, até agora, único contributo recebido.

espelhos

Diz a sabedoria popular que conseguimos ver-nos nas costas dos outros. Tendo a concordar.
O que me traz ao teclado, apesar de estreitamente relacionado, é de cariz diferente e fruto de uma meditação subsequente a uma conversa recente com alguém que apenas designarei por pessoa de eleva estatura – elevada para mim, claro, que sou baixo e gordo.

Sem tentar reproduzir de algum modo a dita conversa, há que fazer um preâmbulo de modo a enquadrar melhor a questão.

Considero-me atento, em tudo, particularmente nas conversas que mantenho: tento ouvir para além das palavras, ler para além das linhas, tentar encontrar a causa das palavras ditas e das subentendidas, é uma espécie de jogo que faço comigo mesmo, em que raramente envolvo a outra parte, já que nem sempre essa outra parte estará preparada para a intromissão que este modo de estar representa. Julgo ser medianamente sucedido nesta análise, já que aparentemente consigo, nalgumas circunstâncias, perceber, chegar comprovadamente à essência de quem comigo vai compartilhando ideias e pensamentos.
Enquadramento feito.

Constituiu novidade quase absoluta estar na outra pele: páginas tantas (e tantas páginas), reparei que estavam do outro lado da conversa a conseguir olhar para a tal essência, a ver coisas que estão por cá e que passam frequentemente despercebidas, uma sensação de nudez que provocou um desconforto momentâneo.
Passado esse momento, restou um bem-estar: afinal, era uma pessoa normal quem estava a olhar para mim.

08 maio 2007

espreitar 4

Links: poucos mas bons.

aparentemente...

… eu nunca existi – ou, pelo menos pareço-me com alguém que nunca existiu.
Parecem palavras sem nexo, mas podem até nem ser; é, de facto, uma expressão assexuada, pois não tem género definido – a frase – e, como tal, não tem sexo: ou seja, um comentário
sem nexo nem sexo.
Mas eu até que escrevo, até que leio, até que evito gralhas, passo as frases pelo corrector ortográfico, tento acertar os tempos verbais: será que nunca existi? Talvez.
Talvez tudo o que aqui está tenha sido escrito por uma outra pessoa que não eu, uma pessoa real, aquela que efectivamente escreve e publica matérias sem interesse, que fala por mim das coisas que me irritam, das que me dão prazer, alguém que, por mim e de mim, escreve para todos e para mim. Talvez.
Talvez?
Porra, não, eu existo! Juro...


Obrigado pelo comentário, entendi-o como um verdadeiro elogio :-)

07 maio 2007

i used to live alone before i knew you



a inveja...

... nem sempre é um sentimento negativo.

04 maio 2007

mãe

Hoje sou eu

para quê...

... tentar encontrar uma explicação para tudo o que acontece? Basta aceitar com naturalidade que acontece.
E sorrir.

escrita em dia



03 maio 2007

quem não se sente não é... pois não?

Os conteúdos publicados neste blog são compostos essencialmente por elementos pessoais, ainda que não necessariamente biográficos.
Todos os elementos, mesmo os pessoais ou os biográficos, são ainda assim ficcionais, construídos a partir exagero de realidades, interpretações liberais desta e, ainda, pela total deturpação da mesma, caso tal se mostre conveniente ao melhor fluir do enredo, sendo potencialmente errada qualquer relação que se julgue poder estabelecer entre personagens eventualmente caracterizados nestes conteúdos e personagens da vida real. Traços comuns deverão, por tal, ser entendidos como meras coincidências.

02 maio 2007

geografia

Onde fica Seclin? Como se chamam os habitantes desta localidade?