19 março 2011

dia do Pai

Não sei se era de oiro, mas seguramente que era bem melhor que a média. Ao que consta (não pela boca dele), por ter sido essa a origem e pelo facto de não ter ninguém com quem compartilhar e concorrer nas preferências, teve o que quis, quando quis.
Não obstante, não foi nada disso que o moldou: muito pelo contrário, tornou-se numa pessoa espartana, pela necessidade de salvaguardar futuro – principalmente o dos outros, comprometendo sempre nesse processo o conforto do presente – principalmente o dele.
Para além disso, tinha uma obsessiva preocupação com o dever: os compromissos tinham que ser cumpridos até ao fim, custasse o que custasse, mesmo aqueles que tivessem origem nos maiores disparates e erros.
Era a natureza dele.

Conheci-lhe um único deslize; mas coerente com o que sempre foi, nem desse erro alguma vez usufruiu, serviu apenas para os outros, mais para uns que para outros, é verdade, mas nunca para ele. E acabou por pagar caro esse erro, pois era frequentemente usado contra ele, com a chantagem que lhe era movida de perto, através da ameaça da denúncia que lhe iria manchar uma reputação de outro modo imaculada.
Por isso e com o passar dos anos, foi suavizando o discurso, foi amolecendo na acção e na exigência – para com os outros, manteve sempre a mesma exigência para com ele mesmo. Mesmo deixando de exteriorizar, nunca deixou de sentir essa preocupação, nunca deixou, lá dentro, de ser quem era.
Na minha ideia, o facto de interiorizar demasiado o que sentia, o ser obrigado pela chantagem a viver contra alguns dos seus princípios acabou por o corroer e descaracterizar, devagar mas definitivamente, e ter-lhe-á em última análise determinado o destino.

A custo, nalguns momentos a muito custo, aprendi com aquele carácter, fez-me parte do que sou, igual, nalgumas coisas, totalmente diverso, em muitas outras. Mas por causa dele sou.

Ficou a escassos 5 dias de completar mais um aniversário, que era hoje.
Fazia anos no dia do Pai. E era meu Pai.



3 comentários:

Stiletto disse...

Não há palavras. Sei o que é. Um beijo

Cristina Silva disse...

Perdi o meu há 7 meses. Ainda estou a aprender a viver sem ele. Um abraço apertado.

Gosto sempre de te ler.

Paulo de Almeida disse...

As lembranças ficam sempre. As boas e as más, embora nos recordemos quase sempre das primeiras.
Sei bem o que isso é, não porque já tenha perdido o meu (apesar de tudo, felizmente que não) mas porque também perdi alguém muito querido que partilhava com o seu a data em que nasceu: a minha avó.

Ainda hoje a visito, onde repousa eternamente.
Todos os dias me lembro dela...
É lixada, a saudade...

Grande abraço.